quinta-feira, 2 de agosto de 2007

À deriva II

"cogito de l´adieu,ce salut sans retour"
Jacques Derrida

Um brinde ao fim, celebro o arranhar da garganta depois de um grito.O fundo do céu ou do poço.Era no céu o meu poço.Marchava, fúnebre, a sinfonia de cacos, a reza, o canto e todo nosso cerimonial.E mais um buraco fincado na terra, no peito, um dia será de outro alguém.
Hoje o tempo passa, a onda apruma, a maresia conforta.Só, mesmo na presença de Deus
Um copo vazio lembra-me a falta, recordo o barulho da rede, da cama,dos passos.E o elo vital lança-me ao mar, a vagar, a sumir.Sem dizer nada ao amanhã o que há de se esperar.
A proa corta perfeitamente a onda, bravejo junto ao mar, tempestade de sentimentos, assim, levo adiante o viver.
A onda que bate pede respostas rápidas que não sou capaz de responder, mal respondo quem sou, o que é ser capaz?A segunda onda é a que vira, exige a superação, uma força maior que não tenho mais, fora de alcance, fora de escolha.Quando busco explicações da segunda,vem a terceira ainda maior, é o exato momento em que conheço o descompasso de uma vida inteira se cobrir por um lençol acolhedor de água e sal ardendo à garganta uma vez já arranhada.
Aliado ao silêncio vem o desespero.Branda água, acalma ao som aveludado das espumas.São elas que conversam comigo, tão serenas, companheiras ingratas.
O céu azul deságua sobre nós, pressão do mar, pressão do céu, é a queda!Mergulho novamente ao fundo, do nada.
Não foi preciso um mês, sequer semanas, bastaram alguns dias.Fez-se no mar o que a terra não foi capaz.A-Deus.